Os anos foram passando. Axl foi estando pior, e eu fui estando na mesma. Apesar de todas as tentativas de Brayce, continuei a odiá-la um bocadinho por dentro, e isso não ajudou muito ao espectáculo. Axl foi internado num hospital psiquiátrico e, ora havia dias em que não queria ver mais ninguém além de mim, aqueles dias em que o amor era realmente o vencedor de todas as coisas, ora havia dias em que ele não me reconhecia e tentava bater-me se me aproximasse dele. Cheguei a ficar com marcas pesadas por causa disso.
As pessoas dizem que tudo fica bem no final. Que tudo vai melhorar, que depois da chuva vem o arco-íris... bem, quer para mim, quer para ele, nunca veio. E eu esperei, juro que esperei, mas nunca veio. Anos e anos de tortura desde que a minha família morrera, uma pessoa por uma uma pessoa. Afinal de contas, aqueles meses que estive com Axl, foram os melhores da minha turma. Apesar de todo o drama, todas as drogas, todas as zangas, todas as traições e mentiras, gostávamos um do outro. Mas claro, algo arruinou aquilo. E eu queria que ele ficasse melhor, mas nem os comprimidos estavam a nosso favor. O irmão dele foi quem mais me apoiou naquela altura. Mas todos aqueles anos não me faziam melhor e eu só queria estar com ele, queria que conseguíssemos ultrapassar finalmente os problemas e ter, ambos, finalmente, uma vida que se prezasse. Nunca aconteceu.
Houve uma tarde em que o fui visitar ao hospital. Ele tinha passado a noite a vomitar no quarto, por isso tinham-no transferido para outro. Disseram que não podia receber visitas, mas de qualquer das maneiras, arranjei maneira de ir. Não sei bem porque o fiz. Assim que me viu entrar, chamou-me com uma voz enraivecida. Pelo menos lembrava-se de mim, ao contrário de certos dias em que me confundia com outra miúda qualquer ou pensava nunca me ter visto antes. Atirou-me nomes à cara, chamou-me puta, cabra, disse que eu era o motivo porque ele estava assim, e empurrou-me contra a parede, finalizando o golpe com um murro que me deixou com metade da cara negra. Já me tinha habituado a não chorar ao final daquele tempo todo, mas naquele dia não resisti. E ele continuou a ofender-me, até aparecer uma enfermeira que me arrastou dali. Depois de ter os ferimentos mais limpos, voltei lá no dia seguinte. Já estava no seu quarto de novo. Estava um dia mais calmo, com os efeitos das drogas que lhe davam, acho que nem tinha bem noção do que estava ali a fazer. Quando entrei, perguntou levemente
"Amanda?" Escorreu-me uma lágrima no rosto e ajoelhei-me ao pé dele, deitado na sua cama. Já tinha tomado a minha decisão. Ele levantou a mão e por momentos baixei a cabeça, assustada, e ele aumentou a velocidade desta, não para me bater, mas para me fazer uma festa na cara. Pediu-me desculpa, explicou-me o acontecimento. Acenei-lhe com a cabeça e disse que sim, que sim, que não fazia mal. De qualquer das maneiras, acho que ele não se lembrou mais daquilo, afinal, estava tão cheio de sedativos... Por isso, beijei-o, o primeiro beijo correspondido e intenso desde à muito tempo. Aproximei os meus lábios do seu ouvido e sussurrei-lhe -
Amo-te - baixinho. Ele sorriu e acenou com a cabeça, acho que foi a maneira dele de dizer também, ou pelo menos achei melhor pensar que sim. Quando saiu, ele apenas gemeu, talvez de dores, mas não me disse mais nada. Dali, vim diretamente para a ponte, a pé - o hospital nem era assim tão distante. Coloquei-me no meio dela e observei à volta. -
Está na hora - disse para mim. Ouvi, por último, os carros a passarem, o som dos turistas por toda a parte, e esperei pela última badalada do big ben para subir a protecção, ou o corrimão, ou como lhe queiram chamar. Ouvi ainda um grito grave masculino atrás de mim, talvez a perceber o que se estava a passar, mas era tarde. Já estava no ar, a cair para o rio. Senti um frio repentino a atravessar a pele. Fui com tanta força que mesmo que quisesse, não conseguia voltar a subir. Não sei bem se morri por falta de oxigénio, por ter batido com tanta força no fundo, ou dos nervos que ganhei no caminho. Não interessava. De qualquer das formas, o mundo não precisava de mim. Axl nunca ia melhorar e nunca voltaria a estar normal comigo, assim como a os meus tios nunca me iam perdoar, assim como nunca voltaria a ver a minha família, pelo menos não se não tivesse feito isto. Assim, juntei-me a eles, algures, honestamente não percebi onde ainda. E espero que o Axl se junte também um dia e consigamos, finalmente, ser felizes nessa altura.
FIMMMM, obrigada cátia por aqueles tempos em que me conseguiste aturar para fazermos este drama todo!